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Descrição do Projecto
O som que se esconde nos torrões é um projeto colaborativo que procura cruzar a disciplina do som com o entendimento do barro/terra próprio da cerâmica, a partir de uma aproximação ao universo sonoro da terra Trafaria, com o objetivo de consciencializar a comunidade sobre o valor da história do lugar e, sobretudo, do potencial dos pequenos detalhes que estão à espera de ser apanhados, tais como torrões no mato.
A terra da Trafaria é aqui pensada como território geográfico e social, mas também enquanto material físico, geológico, na qual se funda a vida da vila. Os processos tecnológicos de captação e de processamento sonoros visam criar uma percepção diferenciada da Trafaria cujo impacto possa ser transformador na vida de quem nela vive e a visita.
Como qualquer ceramista que busca o seu barro na natureza, partimos da recolha de matérias minerais da Trafaria, mapeando o espaço, ao mesmo tempo que procuramos recolher e fazer uma observação sonora detalhada desses processos, isto é, observando os sons que a natureza-terra reverbera quando interagimos com ela.Após essa primeira fase do trabalho, em atelier, procuraremos o som isolado destas matérias naturais, tal como foram recolhidas.
Numa fase seguinte, ao jeito do que acontece na cerâmica, processaremos as amostras e faremos provetas de modo a observar as propriedades do áudio digital, tais com a frequência e a intensidade, por meio de visualização de espectro harmónico e de amplitude. Com a ajuda de softwares como Sonic Visualiser e Audacity obteremos dados que nos oferecerão uma dimensão visual sonora e revelarão uma nova perspectiva sobre o que a argila nos pode mostrar.
Quando a argila se encontra na natureza, no momento de ser recolhida, há diversos materiais que são parte daquela terra primigênia: pedras, areia, fibras, matéria orgânica e outros sedimentos. Todos eles têm influência na compleição da terra, portanto na forma como ela vibra. Na elaboração de objectos, a presença ou ausência destes materiais será também um elemento a ser considerado, como potencial apoio na hora de esculpir o som.
Paralelamente, todos estes processos de recolha e transformação do material geológico e sonoro serão acompanhados de registos fotográficos que poderão ou não ser incorporados na composição visual da instalação. Numa última fase, por meio de técnicas de edição e sampling, os registos de áudio serão transformados numa instalação composta por fragmentos de paisagens sonoras inspirados na zona da Trafaria numa forte ligação imaginária com a matéria geológica.
Em última instância, no que diz respeito à utilização de tecnologias, este projecto pretende ser um convite para as pessoas, tanto locais como visitantes, explorarem os seus territórios com o que têm ao seu dispor. Atualmente, com o
desenvolvimento tecnológico ao nível do utilizador e a sofisticação das interfaces disponíveis, basta um computador ou um telemóvel e sair à rua. Todos podemos, em maior ou menor grau, criar, observar e descobrir através destas ferramentas, tal como todos podemos sair à rua para apanhar torrões e brincar com eles.
... tem qualquer coisa a ver com construir, com criar uma versão ou um imaginário da Trafaria por meio de torrões...pois a percepção de um lugar pode mudar simplesmente ao fecharmos os olhos e ao abrirmo-nos à escuta; podemos ver a história do mundo nas betas da terra, mas também podemos imaginar um outro dentro de um só torrão .